quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Falhas

"Você já viu alguém que se acha mais inteligente do que na realidade é?

Falo daqueles insuportavelmente "certos". Do tipo papai-sabe-tudo (é, daquele seriado antigo). Sempre desconfie das pessoas que dizem saber tudo.

Você deve conhecer alguns, claro. Eles nunca erram. Nunca falham. Sempre culpam alguém ou alguma coisa, mas eles... eles são perfeitos. Transmitem a idéia - e muitas vezes acreditamos - de que o universo conspira a favor deles. É como se tivessem um toque mágico, divino.

Há pouco, recebi do professor Eleutério Dallazen, do Centro Cultural Brasil Estados Unidos, uma mensagem muito bonita sobre pessoas e suas imperfeições.

Tem tudo a ver com o parágrafo acima. Chama-se "Falhas", a qual repasso para vocês."

"Uma das coisas que fascina na cidade de San Francisco é ela estar localizada sobre a falha de San Andreas, que é um desnível no terreno da região que provoca pequenos abalos sísmicos de vez em quando, e grandes terremotos de tempos em tempos.

Você está deslumbrado, caminhando pela cidade, apreciando a arquitetura vitoriana, a baía, a famosa Golden Gate e, de uma hora para outra, pode perder o chão. Ver tudo sair do lugar, ficar tontinho, tontinho. É pouco provável que vá acontecer justo quando você estiver lá, mas existe a possibilidade. Isso amedronta, mas ao mesmo tempo excita, vai dizer que não?

Assim são também as pessoas interessantes: têm falhas. Pessoas perfeitas são como Viena, uma cidade quase perfeita. Linda, sem fraturas geológicas, onde tudo funciona e você quase morre de tédio.

Pessoas, como cidades, não precisam ser excessivamente bonitas. É fundamental que tenham sinais de expressão no rosto, um nariz com personalidade, um vinco na testa que as caracterize.

Pessoas, como cidades, precisam ser limpas, mas não a ponto de não possuírem máculas. É importante suar na hora do cansaço. Também  é bom  ter um cheiro próprio, uma camiseta velha para dormir, um jeans quase transparente de tanto que foi usado, um batom que escapou dos lábios depois de um beijo, um rímel que borrou um pouquinho quando você chorou.

Pessoas, como cidades, têm que funcionar, mas não podem ser previsíveis. De vez em quando, sem abusar muito da licença, devem ser insensatas, ligeiramente passionais. Devem demonstrar um certo desatino, ir contra alguns prognósticos, cometer erros de julgamento e pedir perdão depois. Aliás, pedir perdão sempre, para poder ter crédito e errar outra vez.

Pessoas, como cidades, devem dar vontade de visitar, devem satisfazer nossa necessidade de viver momentos sublimes, devem ser calorosas, ser generosas e abrir suas portas. Devem nos fazer querer voltar, porém não devem nos deixar 100% seguros, nunca.

Uma pequena dose de apreensão e cuidado devem provocar. Nunca devem deixar os outros esquecerem que pessoas, assim como cidades, têm rachaduras internas. Portanto, podem surpreender.

Falhas. Agradeça as suas, que é o que humaniza você. E fascina os outros."

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